sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Ritmo e Prazer

     Me encanta o estudo da psicologia e do comportamento humano! Quem acompanha meu trabalho e minhas escritas sabe que sempre procuro fazer essa ligação com a Dança de Salão. Estou terminando de ler o livro Prazer: uma abordagem criativa da vida, do Alexander Lowen e tenho por meta escrever uma postagem abordando o tema do livro e como isso influencia nossa vida e nossa dança. Mas hoje, lendo uma parte do livro, o tema teve um apelo muito forte e significativo que me inspirou a dedicar uma postagem ao assunto "Os Ritmos do Movimento". Como estarmos fora de nosso ritmo nos distancia do prazer.


     Nosso organismo funciona ritmicamente gerando a mobilidade espontânea, o coração bate, os vasos sanguíneos se expendem e sem contraem, a respiração é contínua e a atividade celular nunca cessa. Essas atividades são involuntárias e dotadas de um ritmo que varia de acordo com a excitação do organismo e de suas partes.

     Na relação com o mundo externo, que abrange nossos contatos com as pessoas e ambientes as quais convivemos, nossas atividades são voluntárias, recebemos estímulos e respondemos com movimentos. A parte do corpo mais envolvida nessa atividade é a externa. Todo estímulo à superfície do corpo e por ele percebido é agradável ou doloroso. Segundo Lowen, não existe estímulos indiferentes pois o estímulo que não consegue criar sensação, não será percebido.

     Reagimos diferente à estímulos idênticos, o que gera prazer para uns pode representar dor para outros, o momento e a situação também influenciam, como quando se está concentrado em uma atividade, a pessoa pode recusar receber um carinho para não perder a concentração, mas um tapinha nas costas pode ser sinal de aprovação e gerar um estímulo positivo. Quando os estímulos harmonizam com os ritmos de nossos corpos encontramos prazer. A música que adoramos dançar, será incomoda quando estivermos tentando pensar, nossa comida predileta não terá o mesmo sabor se estivermos sem apetite e assim funciona em todos os outros sentidos.

     Segundo Lowen (1984, p. 201), a relação entre ritmo e prazer é claramente vista na função motora da parte externa do corpo, isto é, nos movimentos voluntários. "Qualquer atividade motora, realizada ritmicamente, é agradável. Se for realizada mecanicamente, sem sensação de ritmo, adquirirá qualidade dolorosa". Ele cita com o exemplo o andar, quando se anda ritmicamente, o andar é agradável, mas quando se tem pressa a atividade se transforma numa tarefa e perde o prazer. Podemos avaliar o prazer ou a falta dele, na vida das pessoas, pela forma como se movem. A pessoa que vive com prazer move-se com ritmo, sem esforço e graciosamente. Mas em nossa cultura nos deparamos com andares rápidos, compulsivos e bruscos, revelando a falta de alegria em suas vidas. Na dança de salão, principalmente quando realizada de improviso (não coreografada), até os mais leigos conseguem perceber se os dançarinos estão bailando com alegria e prazer ou se estão apenas preocupados com o desempenho.

     Se nos identificamos com nossos corpos e sua busca de prazer, nossos movimentos tornam-se rítmicos. A dança é um exemplo clássico do prazer em movimentos rítmicos. A música coloca sua vibração em contato com nossos corpos, que responde em padrões rítmicos dos passos de dança. Quando não estamos acompanhando o ritmo da música ou quando a música não se harmoniza com nossa vibração interna temos uma sensação desagradável.

     Os movimentos involuntários, diferente dos voluntários, exigem muita coordenação antes de se tornarem rítmicos, como as danças e os esportes, por exemplo. Para a aquisição destas e outras habilidades precisasse de dedicação e esforço. Conforme se adquire maior coordenação nos movimentos do corpo, estes se tornam mais rítmicos e geram maior prazer. Pessoas com mais coordenação, buscam ritmos mais complexos para excitar seus corpos. Quando se adquire qualidade rítmica, o prazer é grande, porém no momento que ser perde o ritmo a atividade passa a ser um doloroso combate. Por exemplo, uma pessoa depois de um tempo se dedicando à aulas e práticas de dança, atinge uma boa qualidade rítmica dos seus movimentos e sente muito prazer dançando, mas se por uma força qualquer precise passar um período afastada dessa atividade, quando retorna, esta, antes prazerosa, pode se tornar dolorosa, pois perdeu o ritmo e precisa recomeçar.

     Dividimos nossas atividades em coisas que fazemos seriamente, com um propósito ou ganho e coisas que fazemos por divertimento ou prazer. No aspecto sério da vida, a atividade rítmica espontânea parece não ter lugar. As pessoas andam mecanicamente, trabalham compulsivamente e falam monotonamente, sem ritmo e, algumas vezes, sem pé nem cabeça, procuram ter a eficiência fria de uma máquina. Devido à ausência de ritmo, perdem o prazer nessas atividades e depois tentam recuperar o ritmo nos esportes, dança, jogos e outras formas de recreação. Mas muitas vezes são frustradas pelo impulso compulsivo do ego em obter sucesso ou perfeição.

     A dança, que é uma atividade que proporciona tanto prazer, se realizada com a premissa no desempenho, sem seguirmos nosso próprio ritmo, logo passará a ser desgastante e desprazerosa. Não somos como máquinas que têm eficiência por estarem programadas a apenas um padrão de movimento rítmico. Somos dotados de um número quase ilimitado de padrões rítmicos que variam conforme disposições e desejos, que mudam conforme a excitação varia. Somos capazes de entrelaçar padrões rítmicos complexos para aumentar nosso prazer e alegria. Somos estruturados biologicamente para o prazer não para a ser eficiente. O homem é um ser criativo, não produtivo. (LOWEN, 1984)

     Temos que tomar cuidado para que nosso prazer não seja sacrificado em prol de nossa produtividade. Se no momento essa mudança ainda não pode ser alcançada em seu trabalho, fica a reflexão! Mas, principalmente, procure não adotar esse padrão rítmico em suas atividades de lazer. Essa semana li uma frase que casa com isso, "não existe caminho para a felicidade, a felicidade é caminho" (autor desconhecido).

     Encontre o seu ritmo e o prazer de viver!


REFERÊNCIAS

LOWEN, Alexander. Prazer: uma abordagem criativa da vida. São Paulo: Summus, 1984.

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